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Analfabetos digitais terão vida difícil na sociedade

A afirmação é do consultor Don Tapscott, autor de “A Hora da Geração digital”, que pesquisa de que forma os jovens nascidos na era da internet estão mudando o mundo

Fonte: Valmir Moratelli, iG Rio de Janeiro
Foto: Reuters 

Tecnologia vai ajudar as pessoas a ficarem mais informadas e mais inteligentes
A geração atual já nasceu em frente a uma tela de computador, foi alfabetizada com auxílio das novas tecnologias e, por isso mesmo, é classificada como a geração dos “jovens multifuncionais”. São os que trocam mensagens, estudam, falam ao telefone, namoram, fazem upload de vídeos, navegam no twitter, trocam fotos e apóiam candidatos à presidência. Tudo ao mesmo tempo e pela internet.

Para o pesquisador canadense Don Tapscott, autor do recém-lançado livro “A Hora da Geração Digital (Ed. Agir), a educação digital provocou uma reviravolta na forma do aprendizado. Por isso mesmo, aqueles que não têm acesso a computadores vão disputar de forma desigual um espaço no mercado de trabalho e na sociedade. “Eles terão que aprender essas ferramentas em uma fase posterior da vida, e vão estar em desvantagem. Os jovens que crescem sem as tecnologias digitais estão na mesma desvantagem que os imigrantes digitais, como eu”, diz Tapscott, que é presidente da empresa de pesquisa e consultoria nGenera Innovation Network, professor da Universidade de Toronto e autor de mais de dez livros sobre internet, entre eles o Best-seller “Wikinomics” (sobre a cultura da realidade virtual).

Em conversa com iG, Tapscott defendeu o uso escolar de pesquisas online. “Não acho que, automaticamente, o Google faz as pessoas mais inteligentes, mas certamente ajudam as pessoas a tomarem decisões mais informadas. Nas escolas, por exemplo, por ter esse corpo enorme de informações em um dos dedos, é menos importante memorizar os fatos. Isso libera o tempo dos alunos a concentrar-se em conceitos mais importantes”, analisa.

A seguir, a entrevista.


iG: É muito comum os estudantes copiarem trabalhos disponíveis na internet. A “geração digital” pode fortalecer o plágio?
TAPSCOTT: Sim, é fácil de copiar informações da Internet. Os alunos devem ser informados que o plágio não é tolerado. Se os alunos receberem instruções claras quanto ao que constitui plágio e escolherem ignorá-las, devem estar preparados para as conseqüências.

iG: Por que você acredita que o Google faz as pessoas mais inteligentes?
TAPSCOTT: Não acho que, automaticamente, o Google faz as pessoas mais inteligentes, mas certamente ajudam as pessoas a tomarem decisões mais informadas. Nas escolas, por exemplo, por ter esse corpo enorme de informações em um dos dedos, é menos importante para memorizar os fatos, o que os professores fariam em muito mais tempo. Em termos de história, o aluno deve estar ciente das principais forças que influenciam o desenvolvimento de um país, mas não acho que é essencial memorizar datas de batalhas. Quanto à necessidade de memorização de informações, isso libera o tempo dos alunos a concentrar-se em conceitos mais importantes.

iG: Em seu livro, você diz: "é mais difícil de ensinar a cães velhos truques novos." As pessoas de outras gerações não poderão acompanhar as mudanças?
TAPSCOTT: Os mais velhos podem acompanhar as mudanças, mas para eles é muito mais difícil. Os jovens de hoje são a primeira geração de nativos digitais. Eu sou um imigrante digital, ou seja, tive que aprender a língua e cultura digitais. Para os jovens é como o ar. Eles são os primeiros a entrar na era digital com uma orientação global, acesso ao conhecimento, espírito de colaboração e pensamento inovador que a minha geração só poderia invejar.

iG: Um jovem, entre 15 e 20, que nunca teve acesso às novas tecnologias, como em muitos casos no Brasil, por exemplo, ainda pode se inserir na “geração digital”? Ou já está competindo de forma desigual?
TAPSCOTT: Os jovens que não têm acesso às tecnologias digitais não têm as habilidades de computador que a Geração Net apresenta. Como os imigrantes digitais que eu falei anteriormente, estes jovens terão que aprender essas ferramentas em uma fase posterior da vida, e eles vão estar em desvantagem. Os jovens que crescem sem as tecnologias digitais estão na mesma desvantagem que os imigrantes digitais, como eu.

iG: Que conseqüências podem sofrer estes “excluídos” em uma sociedade altamente digital?
TAPSCOTT: A participação delas na sociedade será mais difícil, sem dúvidas. Garantir que os cidadãos tenham igual acesso às tecnologias digitais deve ser uma alta prioridade para qualquer país que quer competir na economia global.

iG: Você afirma que “a geração internet é a antítese da geração TV”. Por quê?
TAPSCOTT: Ao invés de apenas sentar em frente da TV como a minha geração fez, os jovens de hoje cresceram interagindo, buscando, autenticando, lembrando, colaborando, compondo os seus pensamentos, organizando a informação. Ao invés de serem receptores passivos dos meios de comunicação, eles são uma geração de usuários, agentes, promotores.

iG: O que a “geração digital” significa para o futuro da democracia?
TAPSCOTT: Coisas boas. Atualmente, os especialistas políticos e assessores do setor público mal podem manter o ritmo com a definição dos problemas, sem falar em soluções artesanais. O governo não pode começar a acumular os conhecimentos internos para lidar com a multiplicidade de desafios que surgem. Precisam criar oportunidades para um diálogo sustentado entre os eleitores e os eleitos. A geração net irá responder a isto.

iG: Como as novas tecnologias podem auxiliar a democracia?
TAPSCOTT: Posso ver um novo modelo, onde os cidadãos estão mais envolvidos. Por muito tempo, temos vivido no que tenho chamado de democracia de transmissão. Eleitores só agiam durante o período eleitoral. Eles tinham pouca ou nenhuma influência entre as eleições, quando os legisladores e formadores de opinião eram responsáveis e os cidadãos apenas personagens passivos. Até recentemente, o modelo que imperava era o do "você vota, eu mando". O sistema carece de mecanismos que permitam ao governo se beneficiar da sabedoria e do discernimento que uma nação pode oferecer coletivamente.

iG: Como isso seria possível?
TAPSCOTT: Não estou propondo uma espécie de democracia direta, onde os cidadãos votariam online todas as noites após o noticiário da TV. Isso equivaleria a uma multidão digital. Como primeiro passo, devemos usar tecnologias de Web 2.0 para permitir a voz aos cidadãos, a fim deles poderem contribuir com ideias para o processo de tomada de decisão – tornando-os engajados na vida pública. Quando os cidadãos se tornam ativos, boas coisas podem acontecer. Nós todos aprendemos uns com os outros. As pessoas se tornam ativas na melhoria das suas comunidades, do País e do mundo.

iG: Por que a eleição de Obama, nos Estados Unidos, é um exemplo da importância de "geração digital"?
TAPSCOTT: Os que compõem a geração net são mais espertos, mais rápidos e mais tolerantes com a diversidade do que seus antecessores. Eles se preocupam fortemente com a justiça e os problemas enfrentados por sua sociedade e são geralmente envolvidos em algum tipo de atividade cívica na escola, no trabalho ou em suas comunidades. Nos Estados Unidos, centenas de milhares deles foram estimulados a apoiar Barack Obama para a presidência. E se envolveram na política pela primeira vez. Esta geração está envolvida politicamente, e vê a democracia e o governo como instrumentos essenciais para melhorar o mundo.

iG: Qual é a diferença dos jovens politizados na era digital em relação à geração anterior?
TAPSCOTT: Na década de 1980 e 1990, esse grupo etário foi amplamente antigoverno, eles sonhavam com o dia que o governo poderia "sair do caminho." Nas palavras de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, o governo era o problema, não a solução. Mas os jovens já não pensam dessa maneira. Eles viram as limitações e os excessos do setor privado, e acreditam que o setor público é fundamental para resolver grande parte dos males que afligem a sociedade. Eles querem o equilíbrio.

iG: Muitos jovens usam a internet sem se preocupar com a privacidade. Como isso afetará as suas vidas no futuro?
TAPSCOTT: Tenho medo da quantidade e do tipo de informação que são casualmente colocadas online. As lições de sites como o Facebook ou MySpace são claras. Os jovens devem utilizar as redes sociais com o senso comum e cuidado e, acima de tudo, ser vigilantes. Depois que uma pequena informação está na Internet, ela não pode ser removido, não importa o quanto se tente.

iG: Você diz que a “geração internet” tem mentalidade comunitária. Isto é correto mesmo quando se diz que os jovens estão mais tempo em casa, em seus computadores, do que no “mundo real”?
TAPSCOTT: Sim. Esta geração tem um tremendo potencial para melhorar o mundo e todos nós devemos trabalhar juntos para ajudá-los com isso. Os jovens de hoje já estão no local de trabalho, no mercado em cada nicho da sociedade. Eles estão trazendo com eles sua inteligência de mídia, o poder de compra, os novos modelos de colaboração e de paternidade (quem é o dono de conteúdos online), empreendedorismo e poder político. Eles têm fortes valores e se preocupam profundamente com o nosso planeta. Em muitos países, o voluntariado dos jovens está em crescente expansão, como nunca antes.

iG: Você consegue pensar o que virá após a “geração digital”?
TAPSCOTT: Uma geração ainda mais digital. Aguarde, por exemplo, quando todos nós teremos uma conexão sem fio permanente de alta velocidade com acesso à Internet, não importa onde estaremos. A vida vai ser interessante.
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