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Sugata Mitra: "Um professor pode ser substituído por uma máquina"

Sugata Mitra: "Um professor pode ser substituído por uma máquina"

Um dos maiores especialistas do mundo em tecnologias educacionais fala ao público da Campus Party 2012, em São Paulo, sobre sua experiência com crianças que aprendem sobre o mundo apenas em computadores, e ensinam umas às outras

Fonte: Época
Sugata Mitra (Foto: Divulgação)
Sugata Mitra, indiano radicado na Inglaterra, veio à Campus Party 2012, no Anhembi Parque, em São Paulo, para falar de um assunto tomado como "chato" por um público de jovens nerds e seus potentes computadores: Educação. O senhor gordinho, de bigode grisalho e algum bom humor acabou lotando as cadeiras de plástico do palco principal da feira para falar de uma experiência cativante com crianças indianas e computadores, e causou impacto ao afirmar que "professores podem ser substituídos por uma máquina". "E o que pode ser substituído por uma máquina deve ser substituído", disse, arrancando aplausos do público. A palestra ocorreu no início da noite desta terça-feira, dia 7.

Mitra é pesquisador e professor de Tecnologia Educacional da Newcastle University, na Inglaterra, e professor visitante do Massachusetts Institute of Technology, o prestigiado MIT, no Estados Unidos. Sua principal pesquisa foi o mote da palestra, intitulada "O buraco na parede... e além". O título se refere à experiência de colocar um computador preso dentro de uma parede, com acesso à internet, em um povoado pobre da Índia, sua terra natal.

"Entre 1999 e 2001, na Índia, havia muitas crianças sem acesso a computadores, e quase nenhum professor para ensinar informática", disse Mitra. Ele resolveu testar a reação das crianças ao aparelho sem a ajuda de professores, simplesmente colocando um no meio de uma favela indiana. Não havia ninguém para ajudar no uso, mas a máquina tinha monitoramento remoto. Estava equipada com teclado, mouse e o mecanismo de busca na web popular na época, o Altavista.

Crianças que não sabiam inglês 
estavam surfando na web, 
ensinando umas às outras"
Sugata Mitra
 
O resultado dos dados de navegação foi surpreendente. "Crianças que não sabiam inglês estavam surfando na web, ensinando umas às outras", disse o professor. Ao repetir a mesma experiência em uma comunidade ainda mais isolada, o resultado de dois meses foi uma demanda técnica das crianças. "Eles disseram que precisavam de um processador mais rápido e um mouse melhor", afirma Sugata Mitra.

Com os resultados impressionantes nas mãos, a equipe de Mitra conseguiu verba do Banco Mundial para prosseguir com a pesquisa, que foi replicada em outras cidades da Índia e da África do Sul. Além de dados, os computadores da nova fase também enviavam fotografias de quem estava usando a máquina e imagens da tela navegada, de dois em dois minutos. Para garantir que apenas crianças navegassem, o teclado e o mouse ficavam em uma caixa de madeira, com um buraco para caber apenas mãos bem pequeninas.

Até 2004, segundo Mitra, 1 milhão de crianças aprenderam sozinhas a usar o computador, em grupo, ensinando umas às outras. E aprenderam o básico de inglês, para poder se comunicar com o mundo. "Em apenas 9 meses, as crianças chegavam no nível de secretárias que trabalham com o computador", disse.

A partir de 2004, a pesquisa seguiu rumos ambiciosos. A demanda por pessoas que falam língua inglesa nos empregos indianos - principalmente em call centers - era, e é, grande na Índia. A ideia de Mitra foi introduzir no computador de uma turma específica um programa que transforma em texto as palavras ditas em inglês. "No começo, elas falavam e o computador não entendia. Disse que elas teriam que fazer com que o computador entendesse", afirmou. "Voltei 2 meses depois e cumprimentei uma criança: 'How are you?' ('Como está você?'). Ela respondeu 'Fantastic' ('Fantástico')", disse. Segundo Mitra, os estudantes tinham baixado uma versão online do Dicionário Oxford. Assim, buscavam a palavra, ouviam a pronúncia e repetiam para o programa instalado pelo pesquisador, que reproduzia a mesma palavra na tela. Era só conferir. "Um professor faria isso. Mas o professor (ele mesmo) foi embora, e só voltou dois meses depois".

Outra evolução da pesquisa foi um teste arriscado, e o resultado, segundo Mitra, era analisar o fracasso. O 'problema' é que não houve fracasso. A proposta: Será que crianças na pré-adolescência entenderiam um texto que explica a biotecnologia na reprodução do DNA? No primeiro teste sobre o assunto, todos tiraram zero, como era de se esperar. Dois meses depois, a mesma coisa. O interessante é que ninguém, segundo Mitra, deixava de se interessar em tentar. Mais dois meses se passaram e o nível de acerto em um novo teste foi de 30%. Sugata Mitra queria 50%, o mesmo nível obtido por crianças das melhores escolas particulares de Nova Deli, capital da Índia.

A estratégia para alcançar esse objetivo foi simples: Escolher uma aluna simplesmente para incentivar as crianças, dizendo coisas como "Fantástico! Na minha idade eu faria muito menos", mesmo que o resultado do 'aluno' em questão não fosse satisfatório. No terceiro teste, as crianças acertaram metade das questões, afirma Mitra.

Atualmente, as pesquisas com crianças e computadores são aplicadas por Mitra em vários países, inclusive no Brasil. Na manhã antes da palestra, no dia 7 de fevereiro, o pesquisador visitou a Casa do Zezinho, um projeto social de educação para crianças de favelas da Zona Sul de São Paulo. A nova configuração do experimento é apresentar grandes questões às crianças e esperar pelo resultado das buscas em grupo.

A questão apresentada às crianças de São Paulo foi "Por que nós sonhamos?". Com apenas um dia de pesquisas, a resposta foi simples, mas surpreendente: "Sonhos são causados pela mente, e Sigmund Freud desvendou seus significados. Mas estudos recentes contestam as conclusões dele", disse Mitra, reproduzindo a resposta dos alunos.

O emprego
dos professores
não seria ameaçado.
Seria diferente."
Sugata Mitra
 
Na polêmica teoria de Sugata Mitra, "o futuro da educação está na auto-educação", e o papel do professor do futuro seria o de apresentar questões que instigam a curiosidade das crianças, principalmente crianças com menos de 13 anos, mais abertas ao conhecimento e menos ligadas a questões como classes sociais. "A reação de crianças abaixo dos treze anos é exatamente igual em qualquer lugar do mundo", afirma o pesquisador. "O emprego dos professores não seria ameaçado. Seria diferente", afirmou.

Como exemplo do sucesso de formular questões interessantes às crianças, ele usou uma pergunta feita para um grupo da Itália: "Como um iPad (tablet da Apple) sabe onde ele está?". O resultado da pesquisa dos alunos foi simples: três satélites localizam o iPad, e assim é possível identificar seu lugar no espaço. Segundo Mitra, ensinar as bases da trigonometria, que explicam de outra forma a questão do iPad, não instiga a curiosidade infantil. "Estudar os ângulos de um triângulo dá sono", diz.

Como um modelo de ensino tão polêmico teria lugar nas escolas? Segundo Mitra, a mudança precisa vir de baixo para cima. "Basta procurar as empresas de tecnologia e investir na banda larga nas escolas, e tudo vai acontecer naturalmente", diz Mitra, que já procurou o governo da Inglaterra para testar seu modelo, sempre sem sucesso.
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